- Carlos Martins da Rocha - Abril de 2019

- Carlos Martins da Rocha - Abril de 2019 

Carlos Alberto Monterroio Martins da Rocha nasceu na cidade do Porto, a 2 de fevereiro de 1952, numa família católica e conservadora. O seu pai, portuense, era médico e docente na Faculdade de Medicina do Porto. A mãe, marcoense, tem 98 anos e sempre foi mãe de família e dona de casa. Dos quatro filhos que os seus pais tiveram, 3 rapazes e uma rapariga, um deles faleceu em 1975.

O nosso entrevistado estudou sempre na cidade onde nasceu. Licenciou-se em medicina na Faculdade de Medicina do Porto em 1975. Casou em 1982 com uma portuense, matemática, que tinha conhecido no Algarve. "Um casamento verdadeiramente feliz, abençoado com quatro filhos, três raparigas, todas já casadas, e um rapaz", sublinha. A família que tem vindo a crescer, já foi enriquecida com seis netos.

O seu currículo é vasto, por isso, dele apenas fazemos uma sintese. Desde 1994, que Carlos Martins da Rocha é médico do serviço de ginecologia (mais tarde serviço de ginecologia e obstetrícia) do Hospital de S. João, onde exerceu várias responsabilidades ao longo dos anos.

Nos anos 80 e 90 diz ter "tido a honra de fazer parte de direções diocesanas e nacionais da AMCP, presididas pelo Prof. Walter Osswald e pelo saudoso Prof. Daniel Serrão". Entre 2014 e 2017, quando a AMCP celebrava 100 anos de existência, presidiu à direção da AMCP. Ainda em termos de serviço à Igreja, com a esposa, faz parte, desde 1989, de uma equipa de Nossa Senhora, a "Porto 100".

 

"Na sua vida terrena, podemos ver em Cristo um médico não só da alma, mas também do corpo, tantas as curas que realizou segundo os Evangelhos."

Carlos Martins da Rocha

 

Em primeiro lugar, muito obrigada por ter aceite o convite para partilhar connosco um pouco da sua vida pessoal e profissional.

É com o maior gosto que acedo ao convite que me foi feito para colaborar na secção “A Entrevista de Vida “ da Newsletter da AMCP, que em boa hora foi retomada pela atual direção nacional depois de uma primeira experiência no ano do centenário.

Antes até de responder às perguntas que me foram colocadas, gostaria de partilhar breves considerações pessoais com os leitores da Newsletter que ajudem a compreender onde fundamento a minha existência, dando sentido às respostas que adiante irei dar.

Tenho a Graça de ser um homem com profunda Fé bem entranhada em mim, que me permite afirmar a minha certeza de que DEUS existe mesmo! Um Deus com quem é possível estabelecer uma relação pessoal de intimidade crescente, de tal forma que o nosso interior se venha a tornar Casa de DEUS, onde Ele se sinta verdadeiramente acolhido e amado!

Fui compreendendo que em Deus e só em Deus se encontra a Vida, a Verdade, a Liberdade, a Justiça, a Paz e o Amor, pelo que, sabendo que venho de Deus como qualquer homem vem, sei que para Ele quero caminhar!

Fui também compreendendo que o único caminho de felicidade que é eterno é o que Cristo nos propõe – pode, por acaso, o mundo dar-nos a vida eterna?

Finalmente, é minha convicção crescente que aquilo que o mundo e a Igreja mais precisam hoje é de cristãos e cristãs que sejam testemunhas vivas de que o nosso Deus é vivo e nos ama!


Para o conhecermos um bocadinho melhor, sempre quis ser médico?

Sou filho e neto de médicos pelo que foi natural a minha opção pela medicina, que foi amadurecendo ao longo da infância e adolescência e que acabou por se concretizar no momento da escolha do curso. Tive também um irmão um ano mais novo que veio a escolher igualmente medicina, mas que não chegou a licenciar-se porque faleceu tragicamente em acidente de viação aos 22 anos, um dos maiores desgostos da minha vida. Uma das minhas filhas, a terceira, também escolheu medicina e é, desde há semanas, reumatologista.


Houve algum motivo em especial ou teve influência de alguém para a escolha da especialidade de Ginecologia e Obstetrícia?

Durante o curso lembro-me bem da emoção que foi para mim assistir a um parto, o que me fez desde logo considerar a possibilidade de vir a escolher essa especialidade médica. Mais tarde, estando no 1º ano do internato de policlínica, o regente da disciplina de ginecologia, Prof. João Silva Carvalho, pessoa a quem estou eternamente grato, convidou-me para monitor da mesma, pelo que comecei a colaborar no ensino da ginecologia em 1976.

Assim, quando chegou a altura de escolher em 1980 qual a especialidade médica que desejava cultivar, foi-me fácil fazê-lo, tendo a nota que obtive no exame de acesso às especialidades permitido escolhê-la e no hospital pretendido – o Hospital de S. João.

Trata-se de uma especialidade que me permitiu conhecer em profundidade crescente o mundo feminino e aprender a acompanhar a mulher na extraordinária experiência que é a gravidez e o dar à luz uma criança! Por tudo isso, não posso deixar de estar particularmente grato a todas as mulheres que tratei como ginecologista, ou a que prestei assistência durante a gravidez e o parto. Por fim, devo aqui atrever-me a confessar que acredito hoje convictamente que sou médico ginecologista e obstetra no Hospital de S. João por Vontade de Deus, que tudo dispôs para tal se concretizar.


Sempre exerceu a sua profissão no Hospital de São João?

Comecei a trabalhar no Hospital de São João em outubro de 1975 como interno de policlínica e, com exceção do tempo em que estive no chamado serviço médico à periferia e, depois, a prestar serviço militar na Força Aérea, sempre trabalhei naquela que é para mim verdadeiramente uma segunda casa. São já mais de 40 anos de vida nessa instituição, em que me formei como ginecologista e obstetra e em que muito aprendi.

Nem tudo foram rosas ou triunfos, mas, o balanço do que lá já vivi, leva-me a estar profundamente agradecido à instituição que me acolheu todos estes anos, gratidão que devo partilhar com a faculdade que me formou e me deu a possibilidade de ser seu docente durante quase 20 anos.


Do que pudemos ler e saber de si para preparar esta nossa conversa, preza muito a imagem Cristo-Médico como aquela que deve ser a do profissional da Medicina no exercício da sua profissão. Porquê?

Tive a Graça de descobrir CRISTO – MÉDICO se bem me lembro em 1993, descoberta que foi amadurecendo em mim nos anos seguintes, de tal modo que veio a tornar-se a minha principal proposta espiritual para a Associação quando iniciei o mandato de presidente em 2014.

Na sua vida terrena, podemos ver em Cristo um médico não só da alma, mas também do corpo, tantas as curas que realizou segundo os Evangelhos.

Podemos, se o quisermos, aprender d’Ele o modo como se relacionava com o homem ou a mulher doentes. Como sabemos que Cristo está vivo e presente no mundo, podemos pedir-Lhe, enquanto médicos católicos, que nos conceda a Graça de nos parecermos cada vez mais com Ele no exercício de uma medicina focada no homem todo e não só no corpo ou partes dele.

Coube-lhe presidir à AMCP num momento importante da história da Associação, por ocasião da celebração dos 100 anos da sua constituição. Pode recordar, sobretudo aos novos associados, como foi vivida a celebração do Centenário da AMCP nos seus principais elementos?

A celebração dos 100 anos da nossa Associação em 2015 foi vivida em clima de ação de Graças e em ambiente festivo. Porque somos médicos com Fé que fazem parte de uma associação integrada na Igreja, começámos as comemorações em janeiro com uma Missa de Ação de Graças por tudo o que a AMCP recebeu de Deus ao longo dos 100 anos da sua existência. Escolhemos para tal a Sé Catedral do Porto, cidade onde a associação foi fundada, tendo a Eucaristia sido presidida pelo Bispo da Diocese, o saudoso D. António Francisco dos Santos, que sempre apoiou as nossas iniciativas. Conseguimos “encher a Sé”, o que muito nos alegrou e fortaleceu a motivação para as iniciativas que estavam programadas. Após a missa, seguiu-se um jantar de confraternização com elevada participação de associados.

Em maio, organizamos uma reunião nacional sobre “A relação Médico-Doente” com forte participação de médicos e em novembro, dirigida aos médicos mais jovens, uma outra reunião no estilo “ Doc talks”. No outono, o núcleo diocesano de Lisboa organizou, a pedido da direção nacional, um evento de âmbito nacional comemorativo do centenário no Centro Cultural de Belém. Contámos com a presença do Núncio Apostólico em Portugal, do Cardeal Patriarca de Lisboa, de uma representante do Presidente da República e do Ministro da Saúde. O evento foi um sucesso devido ao excelente trabalho da comissão organizadora. Terminou com uma celebração eucarística na Igreja dos Jerónimos. Foi nesse evento que foi apresentada à AMCP a medalha comemorativa do centenário, em obra do mestre Avelino Leite, e que foi muitíssimo bem acolhida pelos associados.

No fim do ano, estimulamos a organização pelos diversos núcleos de concertos comemorativos do centenário, que constituíram uma oportunidade para divulgarmos a nossa associação e um modo de encerrarmos as comemorações com chave de ouro. Finalmente, foi para nós altamente consolador e responsabilizante uma delegação da direção nacional ter sido recebida pela Conferência Episcopal Portuguesa aquando da sua 2ª reunião plenária em novembro.

Constituiu uma oportunidade para falarmos da AMCP e dos seus projetos e de reafirmarmos a nossa disponibilidade para aquilo que a Igreja viesse a precisar da associação.


O que sublinha como o principal feito da sua Presidência na AMCP, e o que sentiu que ficou por fazer-se, isto no sentido da melhoria da atuação da Associação?

Desejo sublinhar, em primeiro lugar, que todo o trabalho que desenvolvi foi feito em equipa e que só foi possível porque consegui reunir um conjunto de médicos e um assistente espiritual verdadeiramente excecionais e que se dedicaram à associação com entusiasmo e um autêntico espírito de serviço! Creio que o maior feito do nosso trabalho foi precisamente o espírito com que foi realizado e que, de algum modo, se foi transmitindo à associação. Tanto aconteceu durante esses três anos que me é difícil destacar uma iniciativa concreta. Fico-me por uma de caráter espiritual: a consagração dos médicos à Santíssima Trindade com base num belíssimo texto composto pelo nosso assistente e que se concretizou no fim da missa com que abrimos as comemorações do centenário, repetindo-se na missa de encerramento do congresso da FEAMC em 2016 .

Do que ficou por fazer, destaco o não termos conseguido cumprir os ambiciosos objetivos programáticos de atingirmos os 1000 sócios e de serem constituídos núcleos da AMCP em todas as dioceses.


Fomos espreitar e confirmámos que já está inscrito no curso de formação em Ética Médica, a realizar no próximo dia 11 de maio. Algum tema em especial lhe chamou a atenção?

Felicito a direção atual por esta iniciativa, pois as questões éticas, que se multiplicam com o crescente poder que a medicina tem conquistado, são relevantes para o exercício da medicina e um desafio à Fé Cristã. Quanto ao programa do curso, parece-me muito bem pensado, não me atrevendo a destacar qualquer dos temas previstos.


Que mensagem gostaria de deixar aos estudantes e jovens médicos católicos que acabam de se fazer associados da AMCP?

Nós, médicos católicos, tal como os católicos em geral no mundo ocidental a que pertencemos, somos hoje uma minoria. Deve constituir tal motivo para desânimo? Não, de modo algum, porque sabemos que o nosso Mestre e Senhor está vivo, acreditamos que continua a comandar a História rumo ao porto em que a Humanidade descansará finalmente em DEUS, e que nele podemos confiar totalmente porque não nos abandonará nem ao mundo em que fomos chamados à existência! É esta mensagem de Fé e Esperança que gostaria de deixar aos jovens médicos católicos que entraram na nossa associação, pedindo para todos eles uma Fé viva de modo a serem testemunhas de Cristo Ressuscitado no meio da saúde, da forma que o Espírito inspirar a cada um!

(Na fotografia familiar, faltam a neta mais velha e os netos mais novos)